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domingo, 24 de julho de 2011

Jogo em Família - Parte 3



Caminhou até a mulher e lhe pegou pelos cabelos, mesmo que curtos, assim como fizera com a morena, que chorava no canto da sala. Fez Fernanda subir todos os degraus com a faca fincada em sua perna, e a jogou no banheiro. Os ladrilhos brancos, limpos, iam sendo inundados pelo vermelho sangue, que deixava rastros por onde passava. Viu uma sombra vindo do quarto e suspirou decepcionada.

- Ninguém me obedece...

Murmurou. Olhou para a mulher caída, que tentava se erguer, puxou seus cabelos e a fez bater o nariz na pia de maneira tão forte, que desmaiou. Arrancou a faca de sua perna e, na mesma hora em que virou, enfiou a faca de maneira certeira no coração de Vinicius, que cambaleou para trás, tentando tirar de seu corpo aquele objeto que sugava toda sua vida, e acabou caindo de cabeça no chão do primeiro andar, completamente sem vida.

- Ah droga. Eu tinha planejado algo mais legal, mas enfim.

Sem dar muita importância, a garota voltou para o banheiro, entrou e trancou a porta. Com esforço, pegou o corpo da mulher e jogou dentro da banheira. Ligou as duas torneiras e, na medida em que a água ia caindo, ela ia derrubando todos os remédios que estavam no balcão da pia. Soltou a algema e a olhou ali, inconsciente. Sorriu. Pensou melhor. Voltou a algemá-la, mas agora, com as mãos presas atrás dos joelhos, forçando ainda mais a ferida na coxa. Passaram-se poucos minutos até que a banheira estivesse quase cheia, ela desligou as torneiras e completou o que faltava com cinco frascos de desinfetante. Só precisava do toque final. Abaixou-se para pegar o pacote que tinha escondido entre os produtos químicos no balcão, e quando retornou, viu os olhos escuros de Fernanda se abrir lentamente. Olhos que viam apenas pétalas de rosas sendo jogadas sobre as águas da banheira. Tentou se remexer para respirar melhor, mas era inútil. A perna parecia adormecida de tanta dor, e os braços presos daquele jeito, não ajudavam em nada. Assim que terminou, Milena acenou um adeus para a cunhada e se ajoelhou no chão. Colocou a luva que usava para limpar o banheiro e rapidamente segurou em seu pescoço, apertando forte até que pudesse afogá-la naquela água imunda. A mulher se debatia espalhando água para todos os lados, mas para a garota, aquilo era apenas diversão. Em seu peito, uma paz começava a reinar, a paz do prazer, da certeza de benfeitoria, da vingança. Esperou que Fernanda parasse e então, terminasse de se afogar por si só.

O corpo estava ereto novamente. A luva jogada junto à banheira e, no espelho, o reflexo de um ser angelical a pentear seus cabelos loiros na altura da cintura. Retocou o brilho dos lábios e abriu a porta do banheiro de maneira silenciosa. Não queria acordar a cunhada, afinal, os mortos deveriam ser respeitados, não?

Assim que saiu, viu o irmão levantando, com as mãos nas paredes, procurando apoio. Não disse nada, apenas ficou ali, parada, contemplando a dificuldade em que ele tinha de apenas se locomover. Enquanto o via, lutando por forças para achá-la, via também todas as imagens de tinha dele em sua mente. A maneira como gritava enquanto ela lhe dava os remédios, as noites em que não dormiu por ter que cuidar das crises asmáticas dele, ou as brigas em que saíra machucada por defendê-lo. Os amigos que perdeu, as surras que levou... De todos, ele era o único a quem ela realmente tinha algum apreço. Quem sabe, no interior mais profundo de seu coração, existisse uma cicatriz de afeto pelo irmão, afinal, ele era sangue de seu sangue, a única pessoa que lhe restara depois da morte da mãe. Ela viveu por ele durante longos anos, sofreu, sacrificou-se, e mesmo sem esperar, a única recompensa que lhe fora destinada foi o desprezo e a crueldade. Talvez ele não merecesse sofrer daquele jeito, mas ele merecia morrer, e esta era uma verdade irrefutável.

Resolveu não dizer nada, apenas desceu os degraus que os separavam e o segurou pela cintura. O rapaz perguntava quem era, chorava de dor, mas se entregava aqueles braços que o envolviam em proteção, talvez a irmã psicopata tivesse desmaiado, talvez a salvação estivesse lhe envolvendo, por isso não falou mais nada. Foi conduzido até o quarto de Milena, quando sentiu-se solto e caiu de joelhos no chão. A garota, com o rosto tomado pelo remorso, alcançou na parede a katana que ganhara outro dia. Adorava espadas e facas, e começara sua coleção há alguns meses.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Jogo em Família - Parte 2


Depois destas palavras, atirou na caixa de energia e cortou a luz da casa. Do escuro, seguiram gritos e o arrastar de cadeiras. Passos pesados em sua direção, barulho da tranca da porta e das janelas, desespero.

- Não tentem abrir as portas ou as janelas, vocês são tão tolos que nem viram que elas foram seladas. Os fios de telefones cortados e o aparelho novo que instalei na cozinha, papai, bloqueia qualquer sinal de aparelho eletrônico. Não tentem fugir, meus amados, esta é a noite em que vocês serão abençoados pelo perdão, e poderão entrar no reino dos céus.

Ela tinha todos sob controle, todo o plano mapeado em sua cabeça, nada daria errado. Sabia que o primeiro que viria tentar pará-la era o pai, e por isso seguiu até o meio da escada que dava acesso ao segundo andar, mirou em sua perna, e atirou. Um grito rouco ecoou pela casa, e logo o corpo agonizante do homem ficou estendido no final da escadaria. Estavam todos ensandecidos, o escuro fazia com que batessem em todos os cantos e quebrassem tudo o que lhes fosse uma barreira. Ela era a única que enxergava, passara tanto tempo nas sombras de uma vida, que tinha se acostumado a viver na completa escuridão.

Voltou a subir os degraus um a um, vagarosamente, como se a preocupação não existisse naquela cena cheia de incompreensão e delírios. Sentiu um peso se abater sobre o corpo assim que terminou o primeiro lance da escada, mas ao invés de surpresa, seus olhos esboçaram apenas um sorriso simpático. Ligeiramente ela se virou entre os braços do irmão, tirou do avental duas seringas e fincou em seus olhos, injetando neles uma quantidade considerável de água sanitária, fazendo o rapaz debater-se de dor e, completamente cego, entregar-se ao desmaio já esperado.

Subiu o que restava às pressas, não tinha certeza de quem seria o próximo a tentar impedir-lhe, e precisava estar pronta para qualquer um que fosse. Encontrou uma silhueta robusta quando encostou as costas na parede. O homem iluminado pela luz da lua denunciava Vinicius, que vinha sem medo algum, apenas raiva espumando pela boca. Milena deixou que ele se aproximasse do seu corpo, agarrando-o como se fosse uma capa protetora, perfeito. Puxou o facão do cinto preso na cintura, embaixo do casaco, e enfiou de uma só vez na barriga dele. O homem, mesmo grande, não tinha forças para revidar, então apenas caminhava para trás, seguindo o caminhar da garota que enfiava cada vez um pouco mais da lamina, até que conseguiu derrubá-lo na cama do irmão, já preparada para aquela ocasião.

Ouviu novamente o barulho da porta e sussurros das duas mulheres que ainda estavam lá embaixo. Riu alto e voltou para a sala, passando um pequeno canivete no dedo, até arrancar uma única gota de sangue que logo desmanchou em sua língua. Passou por cima do pai e pegou um comprimido na gaveta do armário ao lado, que era tão pequeno, que desceu facilmente pela garganta de Ricardo, fazendo-o adormecer quase instantaneamente. Arrastou-o até um canto e continuou a olhar Simone e Fernanda, que se encolhiam para a janela. Balançou a cabeça negativamente e se aproximou mais um passo, levando um breve susto ao perceber que as duas tinham pegado facões na cozinha, e cada uma segurava, pelo menos, dois. Respirou fundo e olhou as unhas, virou de lado e levantou o casaco, mostrando o cinto equipado com facas, seringas e balas que carregava.

- É muito perigoso criança brincar com faca, nunca ensinaram isso a vocês?

- Cala a boca, guria, você não vê que nós somos duas e você só uma? – Gritou desesperada a madrasta, empunhando a faca com mais firmeza.

- Acontece que, nem que vocês queiram vão conseguir me pegar. Sabe por quê? Porque eu me tornei muito melhor à medida que vocês destruíam a minha vida.

Aproximou-se mais, dois passos mais, mas o suficiente para que a mulher lhe avançasse e cortasse a manga do casaco. Aquilo fora o ponto final da conversa, Milena apenas bateu em seus rins com as mãos, fazendo-a largar o perigo que segurava. Enquanto a mulher se encolhia, ela pegou uma das algemas penduradas na calça, aparentemente como um acessório, e lhe prendeu as mãos. Sentiu um puxão no cabelo assim que terminou, e logo uma dor dilacerante no ombro esquerdo. Mal teve tempo de rosnar baixo, olhou que Fernanda lhe puxava e fincava a faca em sua carne. Sua reação fora de ódio, mas não podia agir com emoção, tinha de ser racional, treinara todo aquele tempo para poder agir em situações como essa. Pegou uma chave de fenda esquecida na janela, pelas duas que tentavam fugir, e fincou com força na coxa direita da mulher, fazendo-a cair no chão no mesmo instante. Milena levantou e, mordendo os lábios para amenizar o que sentia, retirou a lamina de sua carne, encaixando-a dentro do coturno que lhe vinha até o joelho. O vermelho do casaco se fundia ao vermelho de seu sangue, mas já tinha lidado com dores piores há tantos anos, que estava se tornando imune a elas. Algemou a cunhada e a deixou ali, caída no chão. Pegou a madrasta pelos cabelos e arrastou até a estante marfim, abriu a algema e prendeu junto a uma parte sólida da madeira. Alcançou uma das portinholas de vidro e pegou um pequeno aparelho de som.

- Você não gosta de ouvir musica? Hm? Pois então ouça.

Ligou o eletrônico em um metal extremamente pesado, e em um volume tão alto, que dava para se ouvir do segundo andar. Colocou os fones no ouvido da mulher, que gritou ao sentir aquelas pontadas agudas lhe perfurarem os tímpanos. A garota, ainda insatisfeita, arrancou o lenço do pulso e amarrou a cabeça de Simone junto à estante, apertado o suficiente para que não pudesse escapar, mas frouxo o suficiente para que pudesse respirar, ainda que com dificuldade.

- É a sua vez, cunhadinha.